terça-feira, 18 de agosto de 2015

Contra a violência obstétrica e em defesa do parto humanizado




A violência obstétrica é algo pode ser identificado durante a gestação, no momento do parto, que inclui o trabalho de parto, o parto em si e o pós-parto, bem como o atendimento de complicações relativas à perda da gravidez. Agressões verbais, recusa de atendimento, privação de acompanhante, lavagem intestinal, raspagem dos pelos, jejum, episiotomia e separação da mãe do bebê saudável após o nascimento estão entre os itens da gigante lista de violências obstétricas.

Pesquisa divulgada pela Fundação Perseu Abramo – SESC sobre “Mulheres Brasileiras e Gênero nos Espaços Público e Privado” revelou inúmeras queixas em relação aos procedimentos dolorosos realizados pelos profissionais de saúde antes, durante e após o parto, sem consentimento da gestante e/ou sem a prestação das devidas informações. As denúncias vão desde a falta de analgesia, passando por negligência médica, até diversas formas de violência contra as parturientes. Esse levantamento também mostrou que 25% das mulheres entrevistadas sofreram algum tipo de agressão durante a gestação, em consultas pré-natais ou durante o parto. O assunto teve ainda mais repercussão quando várias mulheres, ao terem acesso aos dados da pesquisa, confirmaram ter passado por situação semelhante durante o parto de seu(s) filho(s).

A realidade mostra que mulheres foram e continuam sendo submetidas a procedimentos cirúrgicos sem justificativa clínica e sem esclarecimento adequado acerca dos riscos e complicações inerentes a tais procedimentos. Em que pese a existência de regulamentações técnicas do Poder Executivo Federal acerca do funcionamento dos serviços de atenção obstétrica e neonatal, aplicáveis aos serviços de saúde no país que exercem atividades de atenção obstétrica e neonatal, sejam públicos, privados, civis ou militares, o cenário de violência obstétrica mostra-se constante, ao passo em que o bom atendimento obstétrico é considerado raro e não faz parte da rotina da assistência ao parto.

Ora, não podemos nos esquecer que, há menos de três anos atrás, no Hospital Municipal Victor Souza Breves, houve um caso grave de violência obstétrica a ponto de causar a morte de um bebê! Trata-se de um episódio que veio a se tornar público e notório, tendo sido amplamente divulgado que uma criança morta foi entregue aos pais numa caixa de papelão.

Finalmente, há que se mencionar que tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei Federal n.º 7633/2014 que pretende tratar do assunto para todo o país, no qual estamos nos inspirando em vários de seus dispositivos, sendo que vários municípios já se anteciparam em criar suas respectivas leis quanto à violência obstétrica. Seriam os exemplos das cidades de Diadema (SP) e Curitiba (PR). Logo, nada mais atual Mangaratiba ter também uma norma que assegure às mulheres um atendimento mais humanizado nas redes pública e privada de saúde, motivo pelo qual apresentei na sessão desta terça-feira (18/08) o Projeto de Lei n.º 21/2015 que versa especificamente sobre o assunto.

Assim sendo, há de ser feito, pois, um esforço concentrado para combater a violência obstétrica praticada pelos profissionais da saúde que se traduz em toda a sorte de violações. Pela relevância da temática e, ainda, como forma de coibir toda e qualquer violência contra a mulher, conto com os nobres Pares e com a sociedade mangaratibense para a aprovação deste Projeto de Lei, o qual busca tratar da humanização da assistência à mulher e ao concepto, bem como de seus direitos no ciclo gravídico-puerperal, quer seja pela realidade mostrada pelos relatos de óbitos de parturientes e seus bebês, quer seja pela dificuldade de colocar-se efetivamente em prática uma política pública mais atenta. 

Segue adiante o texto normativo da proposição legislativa de minha autoria que ainda deverá tramitar nas comissões da Câmara Municipal até ir para aprovação em Plenário.



PROJETO DE LEI N.º 21/2015

Dispõe sobre a humanização da assistência à mulher e ao neonato durante o ciclo gravídico-puerperal, o combate à violência obstétrica e dá outras providências

Art. 1º - A presente lei tem por objetivo promover no Município de Mangaratiba uma assistência humanizada à mulher durante a gestação, pré-parto, parto, perda da gravidez e puerpério nas unidades de saúde em geral, quer sejam públicas ou privadas.

Art. 2º - Para os efeitos desta Lei, a assistência humanizada à gestação, ao pré-parto, ao parto, à perda da gravidez e ao puerpério é aquela preceituada pelas recomendações do Manual de Boas Práticas de Atenção ao Parto e o Nascimento da Organização Mundial de Saúde, a Política Nacional de Humanização (PNH), as Portarias 569/2000, 1.067/2005 e 1.459/2011 do Ministério da Saúde, em conformidade com as orientações da Resolução da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária - RDC nº 36/2008, considerando precipuamente:

I - não comprometer ou oferecer risco à saúde da parturiente ou do recém-nascido, nem à segurança do processo fisiológico de parto;

II – adotar, exclusivamente, rotinas e procedimentos cuja extensão e conteúdo tenham sido objeto de revisão e avaliação científica por parte da Organização Mundial da Saúde (OMS) ou de outras instituições de excelência reconhecida, em cumprimento ao art. 19-Q § 2º, inciso I da Lei Federal nº 8.080/90;

III - garantir à gestante o direito de optar pelos procedimentos que lhe propiciem maior conforto e bem-estar, incluindo a disponibilização de métodos não farmacológicos e farmacológicos para o alívio da dor;

IV – garantir à gestante o direito de escolher as circunstâncias em que o parto deverá ocorrer, considerando local, posição do parto, uso de intervenções e equipe de assistência, seja este vivenciado em diferentes tipos de estabelecimentos de saúde, tais como: hospital, maternidade, centro de parto normal, ou ainda em domicílio;

V – garantir a presença, junto à parturiente, de um(a) acompanhante, a ser por aquela indicado(a), durante todo o período de trabalho de parto, parto e pós-parto imediato.

Art. 3º - São princípios da assistência humanizada no parto e no nascimento: 

I – a mínima interferência por parte da equipe de saúde;

II - preferência pela utilização dos métodos menos invasivos e mais naturais, de escolha da parturiente;

III - fornecimento de informações adequadas e completas à mulher, assim como a(o) acompanhante, referente aos métodos e procedimentos disponíveis para o atendimento à gestação, pré-parto, parto e puerpério;

IV – harmonização entre segurança e bem-estar da mulher e do concepto.

Art. 4º - Toda mulher, em relação à gestação, trabalho de parto, parto, perda da gravidez e puerpério, tem direito:

I – a ser tratada com respeito, de modo individual e personalizado, garantindo-se à mulher a preservação de sua intimidade durante todo o processo assistencial, bem como o respeito em relação às suas crenças e cultura;

II – a ser considerada, em relação ao processo de nascimento, como uma pessoa em sua integralidade, respeitando-se o direito à liberdade, dignidade, autonomia e autoridade moral e ética para decidir voluntariamente como protagonista de seu próprio parto;

III – ao parto natural, respeitadas as fases biológica e psicológica do processo de nascimento, evitando-se práticas invasivas e medicalizadas sem que haja uma justificativa clínica de acordo com o processo de saúde-doença da parturiente ou do concepto;

IV – a ser informada sobre a evolução de seu parto e o estado de saúde de seu filho ou de sua filha, garantindo-se sua autonomia para autorizar as diferentes atuações dos e das profissionais envolvidos no atendimento ao parto;

V - a ser informada sobre as diferentes intervenções médico-hospitalares que podem ocorrer durante esses processos, de maneira que possa optar livremente quando existirem diferentes alternativas;

VI – a ser informada, desde a gestação, sobre os benefícios da lactação e receber apoio para amamentar o recém-nascido desde a primeira meia hora de vida;

VII - a não ser submetida a exames e procedimentos cujos propósitos sejam investigação, treinamento e aprendizagem, sem que estes estejam devidamente autorizados por Comitê de Ética para Pesquisas com Humanos e pela própria mulher mediante Termo de Consentimento Livre e Esclarecido;

VIII – a estar acompanhada por uma pessoa de sua confiança e livre escolha durante o pré-parto, parto e puerpério, nos termos da Lei nº 11.108/2005;

IX – a ter a seu lado o recém-nascido em alojamento conjunto durante a permanência no estabelecimento de saúde, e a acompanhá-lo presencial e continuamente quando este necessitar de cuidados especiais, inclusive em unidade de terapia intensiva neonatal;

Art. 5º - Diagnosticada a gravidez, a mulher terá direito à elaboração de um Plano Individual de Parto, no qual serão indicadas as disposições de sua vontade, nele devendo constar:

I - as equipes responsáveis e os estabelecimentos onde será prestada a assistência ao pré-natal e ao parto, nos termos da Lei Federal n.º 11.634/2007;

II - o local ou estabelecimento de saúde de sua escolha onde o parto deverá ocorrer;

III - a equipe responsável pelo parto, quando possível, ou as diferentes equipes disponíveis em regime de plantão;

IV - a contratação de profissionais que prestam serviços de auxílio ao parto e/ou à assistência ao parto, ou sua participação voluntária, que terão autorização para executar ações complementares às da equipe de atendimento ao trabalho de parto no estabelecimento de saúde.

Art. 6º - No Plano Individual de Parto a gestante manifestará sua vontade em relação:

I – à presença ou não, durante todo o trabalho de parto ou em parte dele, de um(a) acompanhante livremente indicado por ela, nos termos da Lei Federal n.º 11.108/2005;

II – à presença de acompanhante nas consultas preparatórias para o parto e/ou nas consultas de pré-natal;

III – à utilização de métodos não farmacológicos para alívio da dor;

IV – à realização de analgesia farmacológica para alívio da dor com administração de anestésicos, após ser a parturiente informada sobre os riscos e benefícios de tal procedimento para o binômio mãe-filho(a);

V – ao modo como serão monitorados os batimentos cardiofetais;

VI – ao uso de posição verticalizada no parto;

VII – ao alojamento conjunto.

Art. 7º - Durante a elaboração do Plano Individual de Parto, a gestante deverá ser informada, de forma clara, precisa e objetiva pela equipe de saúde sobre as principais rotinas e procedimentos de assistência ao parto, assim como as implicações de cada um deles para o seu bem-estar físico e emocional e o da criança.

Art. 8º - As disposições de vontade constantes do Plano Individual de Parto somente poderão ser alteradas se, comprovadamente, durante o trabalho de parto, forem necessárias intervenções para garantir a saúde da mãe e/ou do concepto em condições de urgência ou emergência que indiquem risco de morte materna e/ou fetal, devendo somente ser realizadas após o consentimento da mulher.

Art. 9º - Toda e qualquer alteração das disposições de vontade constantes do Plano Individual de Parto que for praticada durante o atendimento ao trabalho de parto deve ser registrada no prontuário da gestante pelo(a) médico(a) responsável, mediante justificativa clínica do procedimento adotado.

Art. 10 - Ficam obrigatoriamente sujeitas à justificativa clínica, com a respectiva anotação no prontuário:

I - a administração de enemas;

II - a administração de ocitocina sintética;

III - os esforços de puxo prolongados e dirigidos durante o período expulsivo;

IV - a amniotomia;

V - a episiotomia;

VI - a tração ou remoção manual da placenta;

VII – a adoção de dieta zero durante o trabalho de parto.

Art. 11 - No atendimento à mulher durante o pré-parto, parto e puerpério é vedado aos profissionais integrantes da equipe de assistência à saúde:

I – realizar procedimentos desnecessários ou contraindicados pelas Boas Práticas de Atenção ao Parto e Nascimento, preconizadas pela Organização Mundial da Saúde - OMS;

II - constranger ou submeter a mulher a procedimento ou intervenção desnecessário, com a justificativa de que sua negação causará risco à sua saúde ou a de seu concepto;

III – adotar procedimentos de eficácia carente de evidência científica, classificados nas categorias C e D das Boas Práticas de Atenção ao Parto e Nascimento, ou que sejam suscetíveis para causar dano quando aplicados de forma generalizada ou rotineira.

Art. 12 – Durante todo o pré-parto e parto é permitido à mulher:

I – movimentar-se livremente, devendo ser estimulada a deambular e verticalizar;

II - escolher a posição que lhe pareça mais confortável;

III - ingerir líquidos e alimentos leves.

Art. 13 – Caracteriza-se a violência obstétrica como a apropriação do corpo e dos processos reprodutivos das mulheres pelos(as) profissionais de saúde, através do tratamento desumanizado, abuso da medicalização e patologização dos processos naturais, que cause a perda da autonomia e capacidade das mulheres de decidir livremente sobre seus corpos e sua sexualidade, impactando negativamente na qualidade de vida das mulheres.

Parágrafo único - Para efeitos da presente Lei, considera-se violência obstétrica todo ato praticado pelo(a) profissional da equipe de saúde que ofenda, de forma verbal ou física, as mulheres gestantes em trabalho de parto, em situação de abortamento e no pós-parto/puerpério.

Art. 14 - Consideram-se ofensas verbais ou físicas, dentre outras, as seguintes condutas:

I - tratar a mulher de forma agressiva, não empática, com a utilização de termos que ironizem os processos naturais do ciclo gravídico-puerperal e/ou que desvalorizem sua subjetividade, dando-lhe nomes infantilizados ou diminutivos, tratando-a como incapaz;

II - fazer comentários constrangedores à mulher referentes a questões de cor, etnia, idade, escolaridade, religião, cultura, crenças, condição socioeconômica, estado civil ou situação conjugal, orientação sexual, identidade de gênero e paridade;

III - ironizar ou censurar a mulher por comportamentos que externem sua dor física ou psicológica e suas necessidades humanas básicas, tais como gritar, chorar, amedrontar-se, sentir vergonha ou dúvidas; ou ainda por qualquer característica ou ato físico tais como: obesidade, pêlos, estrias, evacuação, dentre outros;

IV – preterir ou ignorar queixas e solicitações feitas pela mulher atendida durante o ciclo gravídico-puerperal, referentes ao cuidado e à manutenção de suas necessidades humanas básicas;

V - induzir a mulher a aceitar uma cirurgia cesariana sem que seja necessária, mentindo sobre riscos imaginários, hipotéticos e não comprovados, e ocultando os devidos esclarecimentos quanto aos riscos à vida e à saúde da mulher e do concepto, inerentes ao procedimento cirúrgico;

VI - realizar cirurgia cesariana sem recomendação real e clínica, sem estar baseada em evidências científicas, a fim de atender aos interesses e conveniência do(a) médico(a);

VII - agendar cirurgia cesariana sem indicação real e clínica de cirurgia eletiva, mesmo nos casos em que tal procedimento cirúrgico se mostre necessário para o desfecho positivo do nascimento, porém impedindo o início fisiológico do trabalho de parto, a fim de atender aos interesses e conveniência do(a) médico(a);

VIII - recusar ou retardar o atendimento oportuno e eficaz à mulher em qualquer fase do ciclo gravídico-puerperal ou em abortamento, desconsiderando a necessidade de urgência da assistência à mulher nesses casos;

IX - promover a transferência da internação da mulher sem a análise e a confirmação prévia de haver vaga e garantia de atendimento, bem como tempo suficiente para que esta chegue ao local;

X - impedir que a mulher seja acompanhada por pessoa de sua preferência durante todo o pré-parto, parto e puerpério, ou impedir o trabalho de um(a) profissional contratado(a) pela mulher para auxiliar a equipe de assistência à saúde;

XI - proibir ou dificultar que a mulher se comunique com pessoas externas ao serviço de saúde, privando-lhe da liberdade de telefonar ou receber telefonemas, caminhar, conversar com familiares, amigos e acompanhantes, e receber visitas em quaisquer horários e dias;

XII - submeter a mulher a procedimentos predominantemente invasivos, dolorosos, desnecessários ou humilhantes, tais como:

a) induzi-la a calar-se diante do desejo de externar suas emoções e reações;

b) manter a mulher em posição ginecológica ou litotômica, supina ou horizontal, quando houver meios para realização do parto verticalizado;

c) atender a mulher com a porta aberta, interferindo em sua privacidade;

d) realizar exames de toque cervical repetidos, ou agressivos e dolorosos, ou realizados por diversos profissionais, sem o prévio esclarecimento de sua necessidade e a prévia autorização da mulher;

e) proceder à lavagem intestinal (enema ou clister), sem justificativa clínica;

f) proceder à raspagem de pelos pubianos (tricotomia);

g) romper, de forma precoce e/ou artificial as membranas ou a bolsa das águas (amniotomia) para acelerar o tempo do parto;

h) utilizar ocitocina sintética para acelerar o tempo do parto;

i) proceder à dilatação manual do colo uterino para acelerar o tempo do parto;

j) manter a mulher em esforços físicos e cardiorrespiratórios com puxos prolongados e dirigidos durante o período expulsivo;

k) incentivar ou conduzir a mulher a realizar Manobra de Valsalva;

l) praticar Manobra de Kristeller;

m) acelerar os mecanismos de parto, mediante rotação e tração da cabeça ou da coluna cervical do concepto após a saída da cabeça fetal;

n) aceleração o terceiro período do parto mediante tração ou remoção manual da placenta, impedindo o tempo fisiológico da dequitação/delivramento.

XIII – Realizar a episiotomia quando esta não for considerada clinicamente necessária, enfatizando-se, para efeitos desta Lei, que tal procedimento é vedado se realizado para aceleração do período expulsivo por conveniência do profissional que presta assistência ao parto, ou de proteção prévia do períneo para evitar lacerações, não sendo tais justificativas clínico-obstétricas aceitas;

XIV – Realizar episiotomia, quando considerada clinicamente necessária, sem esclarecer a mulher sobre a necessidade do procedimento e receber seu consentimento verbal;

XV – Realizar episiotomia sem analgesia e episiorrafia sem adequada ou suficiente analgesia;

XVI - Amarrar as pernas da mulher durante o período expulsivo, mantendo-a em confinamento simbólico na posição horizontal, ginecológica ou litotômica, sem que ela assim queira se posicionar para parir e sem que tenha sido devidamente orientada sobre os benefícios da posição vertical;

XVII - Manter algemadas, durante o trabalho de parto, parto e puerpério, as mulheres que cumprem pena privativa de liberdade;

XVIII - Realizar quaisquer outros procedimentos sem prévia orientação dada à mulher e sem a obtenção de sua permissão, sendo exigido que o profissional utilize comunicação simples e eficiente para esclarecê-la;

XIX - Submeter a criança saudável à aspiração de rotina, higienização, injeções e outros procedimentos na primeira hora de vida, sem que antes tenha sido colocada em contato pele-a-pele com a mãe e recebido estímulo para mamar, inclusive em parto cirúrgico;

XX – Impedir ou retardar o contato da criança com a mulher logo após o parto, ou impedir o alojamento conjunto, separando a criança de sua mãe e impossibilitando a amamentação em livre demanda na primeira meia hora de vida, salvo se um deles necessitar de cuidados especiais;

XXI – Impedir a mulher de acompanhar presencial e continuamente o recém-nascido quando este necessitar de cuidados especiais no estabelecimento de saúde, inclusive em unidade de terapia intensiva neonatal;

XXII - Tratar o pai da criança ou o(a) acompanhante de escolha da mulher como visita, obstruindo ou dificultando seu livre acesso para acompanhar a mulher e a criança a qualquer hora do dia e da noite.

Art. 15 – Todas as disposições desta Lei se aplicam integralmente no atendimento à mulher em situação de abortamento e no parto de natimorto, sendo as mulheres, nesses casos, consideradas como parturientes para todos os fins desta Lei.

Parágrafo único - Nos casos do caput deste artigo, será também considerada violência obstétrica a coação com a finalidade de confissão e denúncia à polícia.

Art. 16 – A criança recém-nascida tem direito:

I – ao nascimento digno e seguro, e à oportunidade de desenvolvimento saudável desde o primeiro momento de vida;

II – a ser mantida ligada à placenta pelo cordão umbilical por, no mínimo, cinco minutos, a fim de garantir o suprimento de sangue e nutrientes necessários, devendo o cordão umbilical ser cortado somente após a cessação da pulsação espontânea, salvo nos casos de urgente necessidade de intervenção para cuidados especiais;

III – a ser entregue à sua mãe para contato pele-a-pele e amamentação em livre demanda imediatamente após nascer e durante a primeira meia hora de vida;

IV – a não ser separada de sua mãe para realização de procedimentos de rotina, devendo a realização de quaisquer exames ser feita com a criança no colo de sua mãe, salvo nos casos especiais devidamente justificados ou em que haja necessidade de sua remoção para cuidados urgentes e especiais;

V – a não receber leite artificial ou equivalente, quando conseguir mamar, nem receber medicamentos ou substâncias sem autorização da mãe, durante todo o período de permanência no estabelecimento de saúde;

VI – a ser amamentada em livre demanda e ser acompanhada presencial e continuamente por sua mãe para contato pele-a-pele quando este necessitar de cuidados especiais no estabelecimento de saúde, sem restrição de horário ou dias da semana, inclusive em unidade de terapia intensiva neonatal;

Art. 17 – Todos os casos de violência obstétrica praticados pelos profissionais da equipe de saúde serão relatados à Ouvidoria da Secretaria Municipal de Saúde, ao Conselho Municipal de Saúde e à Comissão da Permanente de Comissão de Educação, Saúde, Ação Social e Meio Ambiente da Câmara Municipal de Mangaratiba.

§ 1º - Os profissionais de saúde que praticarem atos de violência obstétrica ficam pessoalmente sujeitos à responsabilização civil e administrativa decorrente de suas condutas.

§ 2º - Os casos de violência obstétrica serão também notificados aos Conselhos Regionais de Medicina e de Enfermagem para os devidos encaminhamentos e aplicações de penalidades administrativas aos profissionais envolvidos.

Art. 18 – Todos os estabelecimentos de saúde que prestarem atendimento ao parto e nascimento deverão expor cartazes informativos contendo as condutas humanizadas elencadas nas diretrizes desta Lei.

§ 1º - Os cartazes previstos no caput deste artigo deverão conter informação referente aos órgãos para a denúncia de ocorrência de violência obstétrica, inclusive sobre o atendimento telefônico no 180, além de orientações sobre como a mulher agredida deve proceder nesses casos.

§ 2º - Equiparam-se aos estabelecimentos hospitalares, para os efeitos desta Lei, as unidades básicas de saúde, as maternidades, os centros de parto normal, os consultórios médicos e de enfermagem, sejam públicos ou da iniciativa privada, bem como o ambiente domiciliar por ocasião de parto feito em casa.

Art. 19 - Os direitos e a proteção à vida de mulheres no ciclo gravídico-puerperal e de seus recém-nascidos de que trata esta Lei, mais especificamente de gestantes, parturientes, puérperas e seus neonatos, são assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos, grau de gravidade ou qualquer outra.

Art. 20 – As disposições constantes desta Lei aplicam-se ao Sistema Único de Saúde e a toda a rede de saúde suplementar e filantrópica existente no Município de Mangaratiba, bem como aos serviços de saúde prestados de forma autônoma.

Art. 21 - Mulheres, crianças, homens e famílias devem ter preservados seus direitos sexuais e reprodutivos, observando-se, especialmente, o seguinte:

I – prestação de informações adequadas sobre gestação, parto e puerpério saudáveis, e sobre os direitos de que trata esta Lei, durante a assistência prestada por profissional individualmente ou por equipe multidisciplinar;

II - autonomia para escolher onde, como e com quem a parturiente quer parir seus filhos e suas filhas, sendo respeitados seus direitos de livre escolha dos profissionais que lhes assistam, do local para parir e de sua diversidade de interesses, cultura e formas de viver;

III - acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde no que tange ao atendimento obstétrico no pré-natal, no parto e no pós-parto imediato e tardio;

IV – tratamento digno e com respeito, principalmente durante o trabalho de parto;

V – a presença e o acompanhamento de, no mínimo, uma pessoa de sua escolha, na assistência de todo o ciclo gravídico-puerperal, independente do sexo, gênero ou relação interpessoal da pessoa escolhida como acompanhante, conforme determinado na Lei Federal nº 11.108, de 7 de abril de 2005;

VI – proteção contra quaisquer formas de abuso e violência, principalmente formas de violência simbólica contra a mulher e o neonato durante o parto e o nascimento;

VII - direito à assistência de saúde humanizada durante seu ciclo gravídicopuerperal, podendo esta assistência ser realizada no domicílio, na unidade básica, em casa de parto, centro de parto normal ou hospital-maternidade, oferecida por equipe multiprofissional ou de forma individual por um(a) profissional técnico(a) e legalmente qualificado(a);

VIII - acesso ao atendimento de urgência, emergência e de referência e contrarreferência nos serviços de saúde maternos e infantis, mesmo quando a necessidade do atendimento tenha se originado em local diferente do ambiente hospitalar, ambulatorial ou básico, incluindo seu domicílio, casa de parto e centro de parto normal.

Art. 22 - A assistência oferecida no trabalho de parto, em instituição obstétrica de qualquer modalidade ou por qualquer profissional da área obstétrica, no âmbito institucional ou domiciliar, público ou privado, deve adotar as seguintes características de rotinas e tecnologias:

I - proporcionar um ambiente desmedicalizado e humanizado, que priorize a visão do parto como um evento fisiológico, não devendo ser praticadas intervenções desnecessárias.

II - garantir que todas as intervenções e os procedimentos adotados durante a assistência à mulher, ao feto e ao neonato fundamentem-se em evidências científicas atualizadas, excetuando-se as intervenções ou procedimentos de leve ou baixa tecnologia e que não provoquem alterações deletérias às condições fisiológicas do binômio mãe-filho(a).

III - garantir respeito à intimidade e à privacidade da parturiente;

IV - respeitar o tempo biológico da parturição, considerando que cada mãe e filho(a) possuem um tempo próprio fisiológico, sendo proibida a prática de intervenções abusivas para reduzir o tempo do trabalho de parto, sem indicação clínica.

Art. 23 – Caberá ao Poder Executivo Municipal praticar regularmente as estratégias promovidas pela Organização Mundial de Saúde, segundo compromissos nacionais e internacionais de promover os direitos humanos e de executar metas de Pactos pela Vida e de redução da mortalidade materna e perinatal.

§ 1º - São estratégias prioritárias a qualificação e a educação permanente de profissionais para promover uma assistência obstétrica de qualidade e realizada por pessoal qualificado.

§ 2º - O parágrafo primeiro do artigo 23 desta Lei não exclui o direito de opção da mulher por um parto domiciliar, devendo os profissionais e os serviços de saúde atender a mulher e a seu neonato em casos de complicações e sempre que solicitados.

Art. 24 – As instituições e os/as profissionais que não cumprirem o estabelecido nesta Lei responderão no âmbito civil e administrativo por suas ações e/ou omissões.

Art. 25 – É recomendável que o Conselho Municipal de Saúde, no âmbito de sua atuação, crie uma comissão específica para acompanhar a implantação desta Lei.

Art. 26 – Fica o Poder Executivo Municipal autorizado a construir uma maternidade que seja separada do Hospital Municipal Victor Souza Breves, em local acessível e centralizado, onde as mulheres mangaratibenses possam receber todo o acompanhamento necessário para a gestação, parto, urgência obstétrica, UI e UTI neonatal, o teste da orelhinha do bebê, além de serviços de imagem como cardiologia, ultrassonografia e cardiotocografia.

Parágrafo único – É recomendável que na futura maternidade haja também um banco de leite humano, serviços de odontologia para gestantes e funcionários, métodos educativos com vista ao planejamento familiar, atendimento ao recém-nascido de risco até completar 04 anos, serviços de cartório para registro, uma sala de vacinas às mães e aos recém-nascidos, fonoaudiologia, fisioterapia neo-natal, serviço social com atendimento às mulheres vítimas de violência sexual, nutrição, terapia ocupacional, laboratório de análises clínicas e anatomia. 

Art. 27 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação, revogando-se as disposições em contrário.


Salas das Sessões, 18 de agosto de 2015.



José Maria de Pinho
Vereador Autor



Imagem: Manifestação feminista divulgada numa notícia do portal do governo do Piauí, extraída de  http://www.saude.pi.gov.br/noticias/2012-11-23/4839/marcha-pelo-humanizacao-do-parto-reune-800-pessoas-em-teresina.html

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